A proposta de emenda constitucional (PEC) que vai alterar as regras
do sistema previdenciário já foi fechada pelos técnicos do governo. De
acordo com o texto encaminhado ao presidente Michel Temer, que deve
bater o martelo na próxima semana, as mudanças vão atingir todos os
trabalhadores brasileiros, do setor privado ao público, militares e até
parlamentares, tendo regimes especiais ou não. Ao contrário do que
chegou a ser divulgado anteriormente, as Forças Armadas entrarão na
reforma da Previdência (veja aqui
o que o economista Paulo Tafner, especialista do Imil, pensa sobre o
tema). E, para fechar brechas legais à chamada desaposentação
(possibilidade de o aposentado continuar trabalhando e recalcular o
benefício), a ideia é deixar claro na Constituição que a aposentadoria é
“irreversível e irrenunciável” — conceito previsto apenas em decreto.
Sobre a desaposentação, há milhares de ações na Justiça, e o assunto
já chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Uma decisão favorável aos
trabalhadores poderá representar um esqueleto acima de R$ 100 bilhões
para a União, segundo estimativas oficiais. A medida valeria para os
novos pedidos e também para orientar as decisões judiciais em andamento.
Até agora, a Advocacia-Geral da União (AGU) vem recorrendo das
sentenças.
Segundo um interlocutor, a decisão de enviar ao Congresso uma
proposta mais abrangente foi tomada antes da viagem de Temer a Nova York
e tem como objetivo ajudar a convencer a opinião pública sobre a
necessidade urgente das mudanças. Essa tarefa, explicou a fonte, é mais
difícil se alguns grupos ficarem de fora da reforma. A intenção de Temer
é enviar a PEC ao Congresso até outubro, se possível antes das eleições
— depois de apresentar o texto às centrais sindicais e líderes dos
partidos.
— A decisão do presidente será política, mas com embasamento técnico — afirmou um técnico envolvido nas discussões.
A opinião é compartilhada por especialistas em Previdência,
levando-se em conta o que o país gasta com aposentadorias e pensões — e,
sobretudo, a enorme distância entre os setores privado e público. O
déficit no INSS neste ano está estimado em R$ 149,2 bilhões, para pagar
30 milhões de segurados. Já no serviço público, o rombo projetado é de
R$ 90 bilhões, mas para um universo de um milhão de beneficiários.
— Entendo como correto e salutar o processo de convergência das
regras da Previdência para todos os trabalhadores — afirmou o
pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Rogério
Nagemine.
O norte da reforma é harmonizar as regras para todos os
trabalhadores, ainda que os regimes continuem existindo de forma
separada. Em linhas gerais, a reforma prevê idade mínima de 65 anos para
aposentadoria e valerá para quem tiver até 50 anos ou 45 anos (caso de
mulheres e professores) na época promulgação da PEC. Quem estiver acima
dessa faixa etária será enquadrado na regra de transição e poderá se
aposentar dentro da legislação atual, pagando um pedágio (adicional ao
tempo que ainda falta para requerer o benefício) de 50%.
Trabalhador rural passaria a contribuir
A ideia é que a fase de transição dure entre 15 e 20 anos (mulheres e
professores), de forma que, se a PEC for aprovada em 2017, todos
estejam dentro das novas regras em 2037. Com isso, acaba a aposentadoria
por tempo de contribuição — 35 anos para homens e 30 para mulheres —,
vigorando apenas a idade mínima, com tempo de contribuição mínimo, que
deve subir dos atuais 15 para 20 anos. Ou seja, se uma pessoa começou a
trabalhar com 18 anos, contribuirá por 47 anos e, ainda assim, terá que
ficar mais tempo na ativa para levar o benefício integral, pois o
cálculo deste deve mudar.
Também acaba o chamado fator previdenciário, que hoje permite ao
trabalhador do setor privado se aposentar ao atingir 85/95, somando
idade e tempo de contribuição para mulheres e homens, respectivamente.
No setor público, onde já existe idade mínima, esta passará do atual
patamar — 60 anos de idade e 35 de contribuição (homens) e 55 anos e 30
de contribuição (mulheres) — para 65 anos.
Assim como no caso de mulheres e professores, que têm regras mais
suaves que os demais trabalhadores (podem se aposentar com cinco anos a
menos), os militares das Forças Armadas deverão ter uma fase de
transição mais leve, diante das especificidades da carreira. Estão no
radar elevar o tempo na ativa dos atuais 30 para 35 anos, acabar com a
quota compulsória (ao chegar a determinada idade, o militar é obrigado a
pedir reserva) e outros ajustes, inclusive na pensão.
Para isso, a PEC se propõe a alterar o artigo 142 da Constituição. Os
militares continuam contribuindo quando vão para a reserva, com
alíquota de 7,5%, mas, mesmo assim, o sistema registrou déficit de R$
32,5 bilhões no ano passado.
Já no caso de policiais militares e bombeiros, estão previstas
alterações no artigo 42. A ideia é fixar idade mínima, e não apenas
tempo de contribuição, como é hoje. A medida é considerada importante
para reduzir a pressão dos gastos dos estados, que viraram 2015 com
déficit de R$ 60,9 bilhões no conjunto dos regimes próprios de
previdência.
Desde que acabou o Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC),
em 1997, deputados e senadores podem se aposentar aos 60 anos, com
benefício integral se exerceram o mandato por 35 anos, ou proporcional,
se por um tempo inferior. Eles seguem os mesmos critérios dos servidores
públicos.
Em outra frente, a reforma deve proibir o acúmulo de pensão e
aposentadoria para novos beneficiários. E o valor da pensão será
reduzido, unificando as regras para todos. A PEC vai mexer ainda com a
aposentadoria rural: os trabalhadores contribuirão com uma alíquota de
5%, semelhante aos microempreendedores. Empresas exportadoras do
agronegócio, que têm isenção, também deverão ser afetadas. Todos, sem
exceção, serão atingidos de alguma forma, disse a fonte.
Fonte: “O Globo”.
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