O economista Eduardo Gianetti |
"As paralisações dos caminhoneiros podem ser o embrião de uma rebelião tributária, que ocorre quando a população deixa de aceitar a legitimidade do governo para cobrar impostos.O diagnóstico é do economista e filósofo Eduardo Giannetti da Fonseca, para quem a má condução da crise pelo governo de Michel Temer levou outros setores organizados da sociedade a perceberem sua vulnerabilidade."
Para Eduardo Giannetti:"O Brasil não passou por algo equivalente à Revolução Francesa e à Americana. Ainda estamos vivendo numa espécie de antigo regime em que os governantes acreditam que as pessoas existem para servi-los, e não o contrário. Eles lidam com a sociedade civil como se ela fosse um ente servil e tutelar, que existe para render tributos e prestígio.
E acho que estamos caminhando para uma situação, que eu espero que seja resolvida nas urnas, quando vamos questionar a prevalência desse antigo regime caracterizado por duas realidades que foram muito bem explicitadas pela Lava Jato.
A primeira é um patronato político que usa o poder para se perpetuar nele e age como se o poder fosse um patrimônio. Aí entra a noção de patrimonialismo de Raymundo Faoro [1925-2003]. E isso vale para todos os grupos políticos que passaram pelo Palácio do Planalto.
Aliado a esse grupo existe um segmento muito relevante do setor privado, do empresariado brasileiro, que, em vez de buscar o crescimento de seus negócios no mercado, criando valor pela inovação e pela eficiência, busca crescer por meio de acesso privilegiado a governantes, num jogo de caça às rendas.
... o esgotamento do ciclo de expansão fiscal começou em 1988. Naquele ano, tínhamos uma carga tributária normal para um país de renda média de 24% do PIB. De lá para cá, todos os governos, sem exceção, aumentaram a carga tributária no Brasil. Hoje, ela está em torno de 34% do PIB.
Além disso, o Estado tem um déficit nominal de 6% do PIB [que é financiado com aumento da dívida pública, NOTA MINHA]. Então, estamos em um país em que 40% da renda nacional transita pelo setor público.
A capacidade de investimento do Estado caiu de 1988 pra cá. Metade dos domicílios não tem coleta de esgoto. Nossos indicadores de saúde, educação, segurança são deploráveis. O Bolsa Família, que é o principal programa de transferência de renda do governo, representa 0,5% do PIB. É praticamente a migalha que cai da mesa. E olha o impacto que tem para dezenas de milhões de famílias. Então, realmente tem algo profundamente errado nas finanças públicas brasileiras. Esta revolta dos caminhoneiros é o embrião de uma rebelião tributária.
... que começa quando a população não aceita mais a legitimidade do governo para tributá-la. A revolução americana começou com o lema “no taxation without representantion” [não há tributação sem representação].
... A democracia existe para permitir correções de voto e mudanças, alternância de poder. Estamos a quatro meses da eleição. Acho perigoso que o quadro se complique a tal ponto que coloque em risco até mesmo a realização de eleições em um clima minimamente civilizado, que permita o debate e o uso dessa oportunidade para tentar melhorar o país." Eduardo Giannetti da Fonseca, UOL, 27/05/2018
A situação fiscal e tributária é um "barril de pólvora" pronto para explodir. Será o que rastilho foi aceso? Sugiro, enfaticamente, a leitura integral desta entrevista do Eduardo Giannetti da Fonseca.
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